As fotografias fitam-nos de lugares plenos de luz. Normal. É da própria essência de toda foto valer-se dos meios luminosos para estabelecer sua existência.
Mas não interessa o quanto de luminosidade uma imagem fotográfica apresente, os caminhos para os quais ela arrasta-nos são sempre caminhos nebulosos, obscuros, cheios de vazamentos de vazios e cicatrizes, para que nossa própria percepção signalética possa preencher as ausências na tentativa de deslindar o que se estabelece além do recorte composicional.
Nas curvas de suas sombras é que a fotografia seduz-nos e leva-nos através de um labirinto de muitos infinitos e veios, onde nem sempre o fio de Ariadne estará para guiar-nos à saída. O risco do precipício interior estará sempre à espreita, plausível e, por vezes, palpável.
Assim como são as imagens, ricas em nebulosidades e entremeios, são as pessoas. Para estas, nas sombras fervilham os desejos, os impulsos e o inconsciente tão combatidos pelas forças retrogradas da moral, da religião e da cultura que, enquanto produtoras de niilismo, tentam sabotar a própria potência da vida. No plano do desejo, a imagem pode trabalhar, ao mesmo tempo, também a favor do movimento do pensamento.
Se as diferenças da percepção individual são tantas quanto as imagens que habitam o mundo, está aí a prova do invisível que nos transborda. A realidade é tudo, menos o que nos parece. Assim é a vida.
{Platão, Nietzsche, Freud, Jung, literatura e poesia animam este ensaio}